sábado, 30 de outubro de 2010

ESTRADAS NACIONAIS


Nos tempos em que era miúdo, o meu pai tirava as suas férias no mês de Setembro. Era uma tradição ir à “terra” apenas em Setembro. É o mês das festas de Nossa Senhora dos Remédios, em Lamego. Actualmente, seria impossível. Desde que Portugal segue as directivas europeias, que as nossas escolas deixaram de abrir somente em Outubro, e o ano lectivo passou a ter início logo a meio de Setembro. É uma pena.

A viagem para Lamego era feita nos moldes tradicionais. Todos acordados e de pé às 4.30h da madrugada. A minha mãe, que praticamente não tinha dormido, fazia os últimos preparativos. O meu pai, no seu método não científico lá ia encafuando as malas e sacos para dentro do porta-bagagem do nosso Citroën “boca de sapo”. Era um Citroën DS de 1972, cinzento metalizado, com a alavanca das mudanças no volante. Foi o primeiro carro de série a ter direcção assistida. O meu pai ainda o tem guardado na garagem. Nunca teve coragem de o vender.

Era uma viagem de 400 km que, nos dias bons e sem muitos camiões, poderia demorar cerca de 5/6h, tudo feito em estradas nacionais. Bom, tudo, não. Os primeiros 25 km da viagem, até Vila Franca de Xira, eram feitos em auto-estrada, um luxo. Passávamos em muitas cidades, vilas e outras localidades, e tínhamos os nossos pontos de paragem favoritos. Ainda hoje me lembro do almoço, sempre no mesmo café, do qual já não me lembro o nome, ali mesmo à saída de Coimbra, e dos deliciosos pregos que aí comíamos. A partir de Castro D’Aire o meu pai dizia que o carro já ia sozinho, nem precisava de acelerar. E eu acreditava piamente nisso.

No banco de trás do DS, para passar o tempo, eu e os meus dois irmãos, sem cinto de segurança nem cadeirinhas, fazíamos, todos ao molho, o jogo das marcas de carros. Quem escolhia a FIAT ganhava de certeza. Eu mantinha-me fiel à Citroën e perdia sempre. Passávamos também o tempo a olhar para os marcos quilométricos. Ver os quilómetros a passar e a diminuir minorava o sofrimento de uma viagem tão longa. Fiquei sempre com este bichinho na minha cabeça.

Há uns anos comprei uma máquina fotográfica digital e a partir daí comecei a fotografar os poucos marcos quilométricos, ainda existentes, do Plano Rodoviário Nacional de 1945. Penso que este passatempo é apenas um pretexto para sair da auto-estrada e mostrar à família as vilas e cidades que fazem o nosso país. Actualmente, entramos numa auto-estrada e saímos numa determinada cidade sem saber por onde passámos. É como entrar num túnel e sair do outro lado. Sempre que posso viajo pelas estradas nacionais, a melhor maneira de conhecer verdadeiramente o nosso país.

Entretanto, voltando aos marcos quilométricos, sempre me fascinou um certo marco, já perto de Lamego que indicava: “Faro – 635 km”. Não entendia, na altura, como é que um marco quilométrico poderia indicar uma cidade que ficava tão longe dali. Só mais tarde percebi que estávamos na Estrada Nacional 2, a mais longa estrada portuguesa.
A Rainha das Estradas.

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